Conforme placa toponímica existente na aldeia, de Açor era natural o lendário “barbeiro” e cirurgião António d’Almeida ou António d’Almeida Freire, que teria pastor anónimo se os lobos não lhe tivessem devorado parte do rebanho. Fugiu com medo das consequências, mas há males que vêm por bem! Assim nos descreve Fernando Costa:
A verdade e a lenda de António d’Almeida Freire – cirurgião Uma das figuras da Serra do século anterior que, a partir de meados dos anos sessenta, mais nos interessou pelo que trazia atrás de si de mistério, foi o de cirurgião António d’Almeida. Pela serra ainda se encontra gente que, por terem ouvido dizer, nos fala dos tratamentos, curas e incisões efectuadas por António d’Almeida ou António d’Almeida Freire, que ficou para a posteridade como o “cirurgião do Caratão”, de Teixeira. Este nosso conterrâneo foi simultaneamente, sangrador e cirurgião, ou somente sangrador? O número de anos dos cursos era diferente. Se esse número de anos para os sangradores era menor que quatro, então é muito provável o António d’Almeida tivesse também frequentado o curso de cirurgião. Embora nunca esclarecendo este importante pormenor, dispusemo-nos a fazer uma crónica tentando separar a verdade da lenda pelo que diz respeito a tal figura, e confessamos que nos foi muito difícil. Inicialmente, a cada passo nos interrogávamos: como foi possível nessa época, em face do total isolamento da freguesia do Colmeal, de grassar o analfabetismo entre os colmealenses, da mais que flagrante falta de recursos económicos dos seus naturais, um moço aqui criado, ao que se presume até aos 15 anos, ir para outro centro urbano aprender tais Artes? Estas questões foram, entre outras, a razão principal das nossas pesquisas. Apesar da longa caminhada percorrida, na busca de dados concretos, e consultada alguma bibliografia – que referimos sumariamente: José Maria Dias Ferrão, João Brandão; Evaristo Franco, Glórias da Medicina Portuguesa; “O Colmeal”, Boletim Paroquial; Registo de Baptismos da Freguesia do Colmeal; Registo de Baptismos da Freguesia de Teixeira; Livro de Óbitos, 1936, 6ª Conservatória do Registo Civil de Lisboa; António d’Almeida (manuscrito de medicina na residência paroquial do Colmeal) – muitas dúvidas continuam a subsistir. A primeira dificuldade com que deparamos foi do nome: António d’Almeida ou António d’Almeida Freire? O mesmo personagem ou duas personagens? Sabemos que em 26 de Maio de 1819 foi baptizado no Colmeal (Góis) um indivíduo de nome António, filho legítimo de Manoel Antunes, do Açôr, e de Maria Braz, do lugar de Carvalhal, neto paterno de Diogo Antunes, do Açor, e de Joana d’Almeida, do Malhô (Cabril), e materno de Francisco Manoel, do Carvalhal, e de Josefa Braz, da Candosa (Cadafaz). Igualmente sabemos também que o mesmo indivíduo veio a falecer no lugar do Caratão (Teixeira), às doze horas do dia 24 de Julho de 1876. Quem participou o óbito, possivelmente familiar bastante chegado, comunicou ter 56 anos (tinha 57 anos) e chamar-se António d’Almeida Freire, viúvo de Maria Gonçalves dos Reis. Será este António d’Almeida o cirurgião do Açor e o mais ainda famoso cirurgião do Caratão? Que seja o António d’Almeida da freguesia do Colmeal, também conhecido por António d’Almeida Freire, parece-nos verosímil, e que faleceu no Caratão também é certo. A lenda diz-nos que, por volta de 1830-35, um moço pastor de nome António, por descuido, deixando a porta do curral aberta, ou quando guardava o rebanho nas encostas da Serra ao cimo do Açor, uma alcateia de lobos atacou, devorando alguns animais. Tivesse o caso passado de uma ou doutra forma, o pastor desorientado, pelas normais contas que teria de prestar, fugiu para parte incerta. Mais tarde alguém o teria identificado em Lisboa, a trabalhar como servente no Hospital Real de São José. Certamente após aprender as primeiras letras e integrado no meio ambiente em que estava vocacionado, assistindo constantemente aos mais variados tratamentos a enfermos, intervenções cirúrgicas, autópsias, etc., matriculou-se na “Escola Médica Cyrurgica”. Com sacrifício e privações, algumas frustrações e esperanças, fez em 31 de Maio de 1842, segundo “Despacho do Conselho de Saude Publica do Reino”, os “exames dos 1º, 2º, 3º e 4º ano” dos diferentes “curços da Escola Médico Cyrurgica de Lisboa”, sendo aprovado Nemine-Discrepante".
DONA MARIA, POR GRAÇA DE DEOS, E PELA CONSTITUIÇÃO DA MONARCHIA, RAINHA DE PORTUGAL, ALGARVES, E SEUS DOMÍNIOS, etc. Faço saber que ANTÓNIO D’ALMEIDA, filho de de Manoel Antunes, natural de Assôr, Termo de Goes, tendo aprendido a Arte de Sangria, e achando-se capaz de usar della não o podendo fazer sem Faculdade Minha, Me pedia lha Concedesse; e visto o seu requerimento, e o Auto de seu Exame, a que por Despacho do Conselho de Saude Pública do Reino fora admitido, havendo sido examinado na dita Arte em o dia 31 de Maio de 1842, na Sala das Sessões do mesmo Conselho, perante o Prezidente do mesmo, o Doutor Francisco Alves da Silva, e pelos Vogaes Examinadores o Doutor João Corrêa de Faria, e João José de Sousa e Silva que o derão por aprovado NEMINEDISCREPANTE, se lhe mandou passar a prezente Carta de approvação, a qual sendo assignada pelo Prezidente e Vogaes do Conselho de Saude Publica do Reino, poderá o dito ANTONIO D’ALMEIDA livremente usar da referida Arte: Pelo que, Mando a todas as Authoridades lha cumprão e guardem como nella se contém e declara; e gosará de todos os Privilegios, e liberdades que em razão da dita Arte lhe pertencerem: e outro sim poderá sarjar, deitar ventonas e sanguesugas. Pagou de Direitos de Mercê novecentos e quinze réis, que se carregarão ao competente Recebedor, como constou pelo Conhecimento põe elle assignado. SUA MAGESTADE FIDELISSIMA, o mandou pelo Conselho de Saude Publica do Reino. Feita em Lisboa aos dias 3 de Junho de 1842.
(…) Com 23 anos regressou à sua terra com o diploma provisório no bolso, no qual, além do seu nome, constava “natural da Assôr, Termo de Góis”, exercer a “Arte de sangria, deitar ventozas, sanguessugas e sarjar” (intervenções cirúrgicas superficiais) (…) Estando há semanas o António d’Almeida no Açor, diz-se ter sido chamado ao Caratão (Teixeira) assistir a um enfermo, de cuja filha acabaria por se enamorar. Deste casamento com Maria Gonçalves dos Reis, então com 15 anos, nascida em 14.4.1827, filha de António dos Reis, no lugar de Caratão, e de Maria da Costa, do Alqueve, nasceram dois filhos: António d’Almeida Freire, o mais velho, que foi “barbeiro” na Teixeira, nascido em 209.1853, que viria a ser professor em S. João de Lampas (Sintra) e falecido em 18.1936. Por sua vez, o António d’Almeida Freire, “barbeiro” de Teixeira, casou com com Bernardina de Jesus. Desse casamento nasceram vários filhos, um dos quais Eduardo d’Almeida Freire, nascido em 10.11.1877, que em 1909 começou a paroquiar a freguesia do Colmeal, onde faleceu em 25.12.1930. (…) Fernando Costa (A Comarca de Arganil, 30.4.1985 e 4.5.1985) (O texto completo pode ser lido em Góis, edições)
A propósito de uma Caminhada entre Cepos e Colmeal, escreve Lisete de Matos: «Enquanto meios ao serviço da relação e da interacção social, os caminhos da caminhada eram os utilizados pelas populações de Ádela e Açor para se deslocarem a Cepos e à sede Freguesia (Colmeal), e o inverso. A acompanhar a morfologia do solo, são caminhos ascendentes e descendentes, que conduzem ora ao topo de montes arredondados pela erosão dos tempos, de onde se avista um horizonte de beleza sem fim, ora ao âmago de ribeiras fundas, que espreitam o sol por nesgas de azul sereno. São caminhos de piso terreento e macio nuns sítios, pedregoso e duro noutros, aqui atapetados de caruma e outras folhas caídas, ali, de pinhas roliças e pedras abaladiças, que dá vontade de chutar, mas não convém, sobretudo as últimas! (…) Eram idas e vindas incontáveis, subindo e descendo, a fim de cultivar os “combaros” e açudes dispersos pelas encostas e ribeiras fragosas; transportar as colheitas para casa; moer o milho (de Açor e Ádela chegava-se a ir moer ao Colmeal), e voltar com a farinha; trabalhar aqui ou ali; transportar sacos de areia e cimento, traves gigantescas, máquinas de costura e outros equipamentos ou móveis; ir a Fajão, à Pampilhosa da Serra ou a outras localidades; devolver a vida ida à terra, transportando os defuntos para serem sepultados (de Ádela e Açor para o Colmeal); ir à missa ao Domingo, deixando as tamancas escondidas numa silveira que havia no Porto Ribeiro (Colmeal) ou à entrada de Cepos; anualmente, para ir e vir das Festas, uma das poucas oportunidades de divertimento de que as pessoas dispunham. Em Açor festeja-se Nossa Senhora da Saúde, em Ádela, S. Lourenço e a Senhora da Luz, nos Cepos o Santíssimo Sacramento e, no Colmeal, o Senhor da Amargura, cuja capela se situa nas Seladas, onde decorrerá o almoço da caminhada. Ambas as freguesias têm como padroeiro S. Sebastião e continuam a dar o Bodo. (…) Com excepção para as idas à missa e às festas (e, ainda assim, poderia ser necessário levar ou trazer alguma coisa), nunca se andava de cabeça ou costas folgadas, especialmente no regresso a casa. Se outra coisa não houvesse, uma lanhita manhosa servia perfeitamente para matar dois coelhos de uma cajadada só. Apesar da infância poupada, ainda hoje há quem regresse com uma pinha ou um pauzito na mão! Coelhos… é que já não há! (…) Os caminhos da caminhada eram também os dos vendedores ambulantes, dos compradores e capadores, do carteiro (Colmeal-Açor-Ádela e o inverso), e das crianças de Ádela e Açor, que iam à escola em Cepos por razões de maior proximidade. Os dois grupos juntavam-se ou separavam-se na Mata (descendo de Cepos, sítio onde se encontra o primeiro curral). (…) Na zona como na região, em geral, a actividade económica dominante era a agricultura de subsistência e a pastorícia. Pelos caminhos, poderão ser observados os “combaros” e lameiros, muitos deles já pouco perceptíveis por baixo dos matagais e silvados que os invadiram, embora se note, a reflectir o amor desmedido à terra-solo, que alguns têm sido limpos.» Lisete de Matos (Caminhada “Trilhos da Ribeira de Ádela”. Um olhar do social e do económico. Abril de 2008 - Ver texto completo)
O lagar situava-se entre Ádela e Açor, na colina entre o Barroco do Porto dos Baqueiros e o Val do Meios, à beira do caminho que antigamente ligava as duas aldeias e por onde ainda se passa a pé. Foi ali construído, em 1902, diz-se que por haver lá uma grande sobreira que era boa para fazer a vara, mas excessivamente pesada para ser transportada para qualquer outro lugar. Pertencia a famílias de Ádela, mas servia as duas povoações. Por razões funcionais, à construção ao lagar seguiu-se a das tulhas, pequenas casinhas de paredes de xisto e telhado em laje – uma por família – onde se ia guardando a azeitona. Todos desmoronados, lembram, hoje, uma aldeia fantasma!.. (…) Para além das levadas activas ou há pouco abandonadas por força do abandono das terras, podem encontrar-se na Lomba de Ádela e na Ribeira vestígios de levadas que se diz serem do tempo dos Mouros. Na realidade parece que datam da época romana, correspondendo a canais para transporte de água ou a valas abertas com objectivos de exploração mineira. De todas as levadas da região, a mais importante é, certamente a Levada dos Mouros… Lisete de Matos (Gente da Serra. Do seu Quotidiano e Costumes, 1990)
Tem Comissão de Melhoramentos, fundada em 2002, cuja raízes remontam ao Grupo de Amigos de Açor, associação informal criada nos anos 60.
População residente, de acordo com as estatísticas oficiais: 1911 - 41; 1940 - 38; 1960 - 32; 1970 - 22; 1981 - 15; 1991 - 17; 2001 - 16
(Mais informações: Gente da Serra. Do seu Quotidiano e Costumes, de Lisete P. Almeida de Matos, 1990)