ORIGEM TOPONÍMICA
Origens do topónimo
A denominação da nossa terra aparece pela primeira vez, em documento escrito, na doação a Anaia Vestrares, em 1114. Escreveu-se então Goes. Depois, ao longo do tempo, por ignorância ou por engano, e certamente outras vezes por acomodamento fonético, aparece-nos, em documentos coevos, como Goiz, Gooes, Goees, Gooees, Guoes, Goões, Guois, Goius e Goios, até se estabelecer no actual Góis.
O novo Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa não altera a sua grafia. Não há ali qualquer regra que dite que os topónimos devam seguir as mudanças estabelecidas nessa reforma, embora alguns sejam expressamente alterados. Aliás, como regra geral, o acento agudo permanece nas oxítonas e nos monossílabos tónicos abertos, como –ói, seguido ou não de –s. O topónimo Góis tem merecido a atenção dos linguísticos, investigadores e curiosos, por se desconhecer a sua origem. E, entre estudos sustentados e conjecturas mais ou menos fantasiosas, encontramos opiniões para todos os gostos. Uma coisa parece ser consensual. Na nossa terra, foi o topónimo que deu origem ao homónimo e não o contrário. Foi ali que a linhagem portuguesa Góis (ou Goes) teve o seu berço, no século XII, espalhando-se por Portugal e originando diásporas pelo mundo de então. Goienses* que, em algumas épocas, deixaram a sua marca na História. Outras linhagens Góis (ou Goes), não lusitanas, tiveram origens em outros países, como Holanda e no Brasil. Mas a de Portugal encontra-se bem sustentada, como originária da nossa terra. Na Europa, existem mais três localidades com nome semelhante: Goes, nos Países Baixos, na península de Zeeland; Gois, na Áustria, perto de Salzburgo; e Goès em França, na Aquitaine, departamento dos Pirenéus Atlânticos. Visitámos pessoalmente todas elas e interrogámos os seus indígenas, forças vivas e “intelectuais” locais, tentando desbravar caminhos, mas, infelizmente, sem nos depararmos com elementos credíveis ou convincentes. Servindo-nos do texto do nosso livro Nos Caminhos dos Góis (2001), em que desenvolvermos este assunto, e acrescentando posteriores informações, aqui deixamos as hipóteses de que temos conhecimento, relativas às questões que se levantam sobre o nome da nossa terra: as suas origens etimológica e toponómica. 1- Segundo a opinião de Leite de Vasconcelos, mais tarde confirmada por Joseph Piel, Goes teria vindo da língua visigótica. Os seus estudos têm aliás originado interpretações incorrectas, julgamos que por deficientes leituras e más transcrições dos textos iniciais, as quais têm-se vindo, infelizmente, a repetir de obra para obra. No gótico haveria a palavra Goia, um antropónimo em que o elemento “goi” procederia de “Gauja”, habitante da região (actualmente, na língua alemã, “gau” ainda significa região, distrito). A sua forma latinizada seria "Goius". Como se sabe, grande parte dos topónimos derivam do genitivo (menos frequentemente, do nominativo ou do acusativo). E alguns dos de origem germânica reflectem na sua terminação um antigo genitivo possessivo, do tipo latino, em –ici, que é frequente nos nomes geográficos surgidos nos séculos V ao IX. Deste modo, da forma Goius, teria sido obtido o nome geográfico Góis: (goia) … goius > goici > gois Mas do mesmo vocábulo gótico Goia, também poderia ter derivado, directamente e não da forma latina, o genitivo patronímico Gois (ou seja, o filho de Goia). Resumindo as duas hipóteses, goia teria originado: (goia)... (geni. poss.) > gois (topónimo) ou (goia)... (geni. patr.) > gois (antropónimo) Pelo valor intelectual dos seus autores, esta opinião é a que tem suscitado maior credibilidade. Ficando no entanto por não se saber que nome teria no tempo dos povos que antes povoaram a nossa região, nomeadamente, os romanos. 2- P. A. de Azevedo, em Alguns nomes dos Baixos Pirenéus que têm correspondência em Portugal formula a opinião de que Góis “...é possível que seja vestígio da antiga ocupação de toda a Península pelos iberos (= alto, num alto)”. Mas sem indicar qual o vocábulo correspondente. (ver também José Pedro Machado, no seu Dicionário Onomástico Etimológico da Língua Portuguesa, II volume). 3- De Almeida Fernandes, em Toponímia Portuguesa (Exame a um Dicionário), 1999): «…devemos ver no nosso topónimo Góis: rochedo, sendo ainda uma das maiores curiosidades paisagísticas da localidade o famoso “Penedo de Góis”. O que custa a compreender é que os “especialistas” (aliás fantasistas eruditos) não reparem nisto, não conjugando “goio” (pedra) com o “penedo”, impressionante, e que se ponham, eruditamente, a fantasiar, a “especializar” o assunto. É possível que ao “penedo” se deva o topónimo, isto é, sem ser preciso mais que ele: por Gaudioso > Gouvioso? Crer-se que não, pelo plural: não Goio, mas Góis? O que suponho é ter Goies sido Goios > “Góis”, ou sua anterioridade similar, muito anterior a 1113-1117 Goes DR 39 – em que também suponho, não o monossílabo actual, mas do dissílabo Go-es, com o fenómeno –os > -es regional, já do século XI para o XII. A origem pode estar (com a evolução poética já apontada) em mais um Gaudiou- sc. locu-, tomando essa evolução a aparência do plural que se diria existir em Goios. Portanto, deve ter bastado o famoso e impressionante “penedo” para criar o topónimo, aparente plural, mas na realidade um adjectivo na origem (cotiosu).» 4- Os austríacos explicam a origem toponímica da sua povoação Gois, na base de uma possível derivação do vocábulo latino “collis” (colina). Na região há uma elevação relevante e a palavra aparece, pela primeira vez, documentalmente, em 1127 (por curiosidade, a mesma época em que temos conhecimento do nosso Góis, na doação de 1114). “Collis” teria originado “Gols”, e depois, já no século XX, adoptada oficialmente a forma Gois. 5- Nós próprios (Nos Caminhos dos Góis) aventuramo-nos por uma explicação fonética, a partir de uma cadeia evolutiva: por lenição, a oclusiva K passaria de surda a sonora (k > g) e, após redução da consoante geminada (assimilação fonética) dar-se-ia a perda do l intervocálico, que é típico do galego-português dos finais do século X: collis > gollis > golis > gois que se teria seguido um anormal abaixamento vocalístico /i/ > e, gois > goes O vocábulo é aceitável na região de Góis: “collis” tem o significado de colina, garganta (no sentido geográfico), montanha (no sentido poético). 6- Em Goes neerlandês, uma bela cidade com cerca de 40 000 habitantes, admitem, como hipótese mais aceitável, Goes ter vindo do nome aquático “Gosa”. Apoiando-se em antigo texto, datado de 976, que menciona o nome latino Curtagosum (a “truncada Gosa”), a cidade ter-se-ia começar a erguer nas margens de uma pequena enseada roubada ao mar, ao longo do século X. 7- Dr. Caetano de Oliveira, em conferência na Associação dos Arqueólogos atribuiu ao povo gróvio (um ramo dos celtas) a etimologia de Goes (Mário Ramos, in Arquivo de Goes vol I, p. 127). 8- Dr. Montezuma de Carvalho, em carta endereçada ao Presidente da Câmara Municipal de Góis, nos anos 80, refere a hipótese de o topónimo ter tido uma origem judaica. “Goy”, na língua hebraica, significa pessoa de uma outra religião, um “estrangeiro” não judeu. E, latinizado, o termo teria dado “gois”. Primeiro povo monoteísta da Península Ibérica, os judeus já aqui estavam antes dos godos e dos romanos, e foram utilizados para povoar as terras conquistadas aos muçulmanos. No meio das lutas religiosas então travadas, numa época em que assiste ao enfraquecimento do cristianismo, não custaria admitir (segundo o autor) que, quando um dos grupos judeus se queria referir depreciativamente a outros, lhe chamasse “os goios”. Góis teria nascido, assim, de uma expressão vocatória. Por os seus habitantes serem profanos, pessoas de outra religião, os vizinhos passaram a referir-se a essa terra, com algum desprezo, por Góis, terra dos goios… 9- Eng. José Luís Nogueira vem recentemente colocar a hipótese de Góis ter assim sido denominada, por o seu donatário, Anaia Vestrares, já ser naquela época “senhor de Góis (em França)”, conforme expressão encontrada num artigo, antes de acompanhar o conde D. Henrique para o Condado Portucalense. Poder-se-á especular que Anaia Vestrares terá tomado posse (e baptizado) as suas novas terras no Condado Portucalense, antes da emissão da carta de doação do “castro de Goes” e terras vizinhas, documento que viria a regularizar a situação de facto já então estabelecida, com o objectivo de povoamento e criação de uma barreira contra os mouros. Supostamente terá feito renascer uma antiga povoação, existente já no tempo dos romanos com denominação que se desconhece, denominando-a agora como o seu senhorio em França. *
Seja de origem latina, hebraica ou goda, seja proveniente do distante Góis gaulês, do Penedo ou da paisagem montanhosa da região, o certo é que Góis continua a seduzir a nossa imaginação.
É um dos encantos da nossa terra. * *
*Na maior parte dos dicionários diz-se que os naturais de Góis denominam-se goisianos. O uso e o tempo consagraram, contudo, a palavra goiense. Goisiano é comumente utilizado quando referindo-se especificamente a Damião de Goes.
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