Desconhece-se a data da primitiva Igreja, ao que parece de modestas dimensões, supondo-se que tenha estado sempre no local actual. Foi sede de uma Colegiada, instituída em 1377, que permaneceria até à extinção destas instituições em Portugal, por decreto de 16 de Junho de 1848. Beneficiava quatro pessoas, por compromisso havido entre o prior de então, Fernão Gil, e o senhor de Góis, Estêvão Vasques de Goes. A Igreja actual – consagrada a Santa Maria Maior, padroeira da freguesia de Góis, com festa litúrgica a 15 de Agosto – é um mosaico de corpos de épocas diferentes. A capela-mor é do século XVI, as capelas laterais dos XVI e XVII, e a nave do XIX.
A nova nave foi reedificada no período 1844-1860, de responsabilidade da Junta da Paróquia. A anterior nave, de menores dimensões, seria desmoronada do cruzeiro para baixo. É de estilo muito simples, sem valor arquitectónico. Não teve aliás qualquer arquitecto ou artista a superintender, sendo erguida ao gosto e aos caprichos dos membros da Junta da Paróquia. A sua construção é, de facto, um exemplo típico das obras públicas, que tanto hoje, passado um século e meio, nos queixamos (e observamos) de derrapagens e de falta de planeamento. Esta terá derrapado exageradamente em tudo, nas asneiras, no planeamento, no tempo de execução, no orçamento, na falta de fundos financeiros, na desorganização. Foi uma construção defeituosa desde o início, obrigando a sucessivas correcções. Ora pelos “riscos” das plantas estarem errados ou incompletos, ora por falta de detalhes, ora por falta de dinheiro, até, porque não, por não ser do agrado do empreiteiro. E assim se foi substituindo o estuque do tecto por madeira, alargando a escada do coro por não estar proporcionada, aumentando-se o volume da nave, prescindindo de uma janela e dos caixilhos de outras, corrigindo-se mais aqui, alterando-se mais ali. Até deu para desabar o primeiro coro construído, por ter “avagado o madeiramento”. Já mesmo na parte final, resolve-se que “a semalha fosse feita segundo o geito jónico”, altera-se o feitio de uma porta, para lhe dar maior segurança, e mais uma série de ajustes, tudo (segundo dizem) para… alindar a Igreja Matriz de Góis. Quem a vistoriou, vindo da Lousã, em Dezembro de 1857, ainda deu para chamar a atenção para os defeitos de construção, ao nível das fundações, que lhe tirava solidez. Mas como tinha havido um terramoto pouco tempo antes, a 11 de Novembro, e as paredes tinham resistido, embora “algum tanto torcidas nas partes médias e as soleiras das portas principal e laterais desunidas e abatidas nas extremidades…”, deu a obra em condições. Desconheço se a Igreja sofreu, desde então, mais algum sismo para a testar. Mas esperemos que Santa Maria Maior nos continue a proteger. Era para durar três anos, depois o empreiteiro pediu mais três, acabando por ser aceite em 1860. Mas os trabalhos prosseguiriam nos anos seguintes, em acrescentos e reparações várias, como a do soalho, que ficara em parte destruído pela humidade do pavimento. Pelo menos, em 1879, ainda se faziam concertos. A falta de dinheiro também não ajudava, com os empreiteiros a exigirem sempre mais e mais pelas sucessivas alterações. Foi edificado à custa do povo e da família Baeta Neves, emigrante no Brasil. Recorreu-se a vários empréstimos, à Câmara Municipal, à Misericórdia, às duas confrarias, a particulares, ao juro de 5% e com hipoteca dos seus rendimentos. Um deles, de um conto de reis, foi de Manuel Baeta Neves, de Corterredor, o nosso Barão de Loredo, de Corterredor, então vivendo no Brasil, empréstimo este afiançado por 20 honrados cidadãos de Góis. Mas o Barão não deixaria também de contribuir com donativos avultados, que motivaria a Câmara Municipal mandar gravar o seu nome em letras de bronze (por cima do púlpito, estão as letras BN e a data 1862). Num dos seus valiosos donativos, no montante 1200$000 reis, vieram oito soldados de Coimbra acompanhar o condutor do dinheiro, tendo-se-lhes pago 3$020… E, naturalmente, impostos sobre o povo não faltaram: aumento da côngrua em 30%, mais 40% sobre a décima da freguesia, mais um terço das rendas das irmandades e confrarias, mais 50% sobre a décima predial da freguesia, mais uma sobretaxa de um real sobre cada quartilho de vinho vendido (só daqui deveria ter vindo uma boa receita). E mais: “todo o indivíduo residente na freguesia será obrigado a contribuir com a devida igualdade para esta obra, e não só com o seu serviço pessoal, mas também com o de uns bois…”. Para o final, com o orçamento estrangulado, novamente se pede à Câmara mais uma derrama sobre os impostos anuais, e depois mais outra ainda… E assim se edificou a nossa igreja matriz, há século e meio. Ou estas obras, ou as da capela-mor, feitas e supervisionadas por D. Luís da Silveira no século XVI, que o dinheiro e o pundonor eram dele (ver noutra página).
Do corpo antigo, seriam retirados dois altares, colaterais ao arco grande para a capela-mor, que julgo se encontram guardados, e mais um outro no corpo, que desapareceu. Parece que haveria um coro ao fundo da igreja. Desta época, também são o corpo da sacristia e o do lado direito da capela-mor, a chamada casa dos ossos, ambos reconstruídos de anteriores, bem como o púlpito, em substituição de outro existente. Do lado oposto ao púlpito, desde a porta da entrada até à capela de São José, construiu-se um pequeno coro, com balaustrada em madeira e escadaria de pedra encostada à parede. Chamavam-lhe o “coro da música”, porque era ali que a filarmónica actuava, em tempo de festas. O meu pai lembrava-se de, em miúdo, ver ali a banda tocar.
A Capela de S. José, do lado esquerdo da Igreja, é pertença da família Barreto Chichorro. Foi mandada construir, em 1640, por António Rodrigues Barreto e sua mulher, que quiseram ficar ali sepultados. Ele era capitão-mor em Góis, filho de Pedro Rodrigues Barreto, que está na toponímia da vila, a rua actualmente denominada Rua da Quinta, por ali ser a Casa da Quinta, então sua residência, hoje Câmara Municipal. A capela viria a dar origem à denominação “Quinta da Capela” (e não por a quinta ter uma capela, como se poderia julgar), pelo facto das propriedades estarem agregadas ao mesmo morgadio. Anteriormente, era conhecida por Quinta do Capitão-Mor, ou por Quinta do Casalinho, depois Quinta da Capela até hoje. Dela fazia parte a Quinta do Baião, que só mais tarde seria desagregada. Um descendente seu, Francisco Barreto Botelho Chichorro Vilas Boas, aproveitaria esta altura das grandes obras, para restaurar a capela, mandando colocar, num friso por cima da porta, em grade de ferro, as suas iniciais “F B B CH VB 1863”, por debaixo do brasão dos Barreto Perdigão. Tinha que deixar ali a sua marca, ou não fosse ele pessoa de forte personalidade, conhecido na região centro. Tinha carta de fidalgo cavaleiro da Coroa Real (como se pode ver descrito no Livro de Diplomas e Cartas Honoríferas da Câmara Municipal de Góis). Adquirira os Paços Velhos “com os casarões que antigamente foram Palácio do Marquez”, o Paço Novo, “denominado o Lambique, que noutro tempo foi o Palácio dos Condes de Sortelha” e as Casas do Hospital. Era também Capitão-Mor de Góis, nomeado por D. Miguel em 1832. Competia-lhe dirigir o comando das ordenanças da zona e fazer a respectiva preparação militar. Chefiava um batalhão de voluntários miguelistas, com sede na sua Quinta da Capela, “regularmente fardado”, que participaria em várias lutas. Ficaria para a História da região, na guerra civil de 1846-47, a guerra da Patuleia. O Batalhão de Góis, combatendo ao lado dos “patuleias”, não conseguindo opor resistência às tropas leais ao governo, faria a sua marcha para o norte, por terras da Beira, juntamente com batalhões de outras regiões e populares, numa fuga atribulada, a que não faltaram fuzilamentos de milicianos apanhados pelas tropas governamentais. O escritor José Rodrigues Miguéis aproveitou esta personalidade para fazer um dos seus contos, que decorre na Quinta da Capela, fantasiando e exagerando, segundo se diz, as suas peculiaridades. Chamou-lhe O Morgado da Pedra Má.
A Capela das Almas, do lado direito, é de data mais antiga, provavelmente do início do século XVI. Em 1642 seria criada a Irmandade das Almas e Santos Passos, com a sede instalada nesta capela, ficando com o cargo da sua conservação. Era na época uma confraria de muitas posses, de tal modo que seria criticada, pelos seus superiores, por fazer festas demasiado luxuosas. Sofreria danificações aquando da terceira invasão francesa, em 1810. E, em 1858, um incêndio destruiria a cinzas o altar, tendo-se comprado então um novo, em Coimbra. Foi restaurada, com as obras da nova nave.
A Capela-mor é a menina dos olhos dos goienses. Pela sua arquitectura e escultura, mas também pelo que representa na História das terras de Góis. Merece por isso uma abordagem em separado (ver neste site em "Património Edificado").
Separada da igreja, temos a torre sineira, com dois sinos, um datado de 1748 (ou 1741), outro, o maior, de 1854. Numa descrição de 1897, diz-se que tinha três sinos, e, segundo os entendidos, deviam ser quatro, de acordo com a disposição das pedras. Foi reconstruída também nesta época, aproveitando-se, pelo menos, os degraus antigos. Há indícios que a torre tenha estado implantada noutro local, Dr. Mário Ramos põe mesmo a hipótese de ter havido duas, uma sineira, outra com relógio.
O corpo da igreja servia de cemitério, bem como o adro. O decreto de 21.9.1835 proibiu os enterramentos nas igrejas e, nesse mesmo ano, a 19 de Novembro, a Câmara deliberava demarcar o cemitério, na época com apenas 333 m.
A Igreja foi sendo espoliada ao longo do tempo, ficando cada vez mais pobre. Por duas vezes, as tropas francesas a roubaram, na entrada e na saída do país. Trinta anos depois, em Janeiro de 1840, houve um assalto, tendo sido levados o vaso do sacrário e custódia, tendo a Junta da Paróquia resolvido vender algumas pratas que escaparam ao roubo, para a compra de outros novos. Em 1874, novo assalto, em que voaram dois cálices. Fora aqueles que não ficaram registados na História. Foram-se os sinos, os altares, não sei quantos santos, o sacrário e custódia…
À época desta grande reconstrução, era sacristão Francisco da Silva Nogueira. Quando decorria o ano 1872, por sentir que o seu ordenado era baixo, vem pedir à Junta a sua exoneração. Para isso, descreve o trabalho que fazia, que justificava outro salário: “tocar as trindades todos os dias pela manhã, ao meio dia e à noite = assistir a todos os baptismos, casamentos e enterramentos = ajudar à missa todos os dias = assistir à comunhão em todos os dias da quaresma = tocar à missa tendo para isso que subir uma escada com mais de 46 degraus = varrer a Egreja e tratar da limpeza dos altares = ter a seu cargo a boa arrecadação dos paramentos e mais objectos pertencentes à fábrica = acompanhar o R. Parocho na ocasião de tirar o folar, pela Paschoa = e tendo finalmente outras obrigações que desnecessário são para fazer dellas aqui mensão…”. Desconhece-se se a resolução da Junta.
Registe-se os padres que paroquiaram a Igreja durante o século XX:
Francisco Pereira Pinto (1902-1933) - Ocupou o seu lugar na igreja de Góis em 1902, por concurso documental, com correspondente alvará passado pelo rei D. Carlos de 31 de Março desse ano. Foi aqui pároco durante cerca de quarenta anos, pois mesmo depois de ser substituído pelo Padre Belarmino Rodrigues Soeiro, continuou com vida activa na comunidade local. Morreu em Góis em 1941.
Belarmino Rodrigues Soeiro (1933-1962) - Veio para Góis em 1933, sendo transferido em 1962, para Figueiró dos Vinhos.
Antonino Barata dos Reis (1962-?) - Em 7 de Outubro de 1962, tomou posse, como novo pároco, substituindo o Padre Belarmino Soares Soeiro. Natural de Cortes.
António Dinis (1966-1980) - Foi transferido em 1980 para Coja.
Carlos da Cruz Cardoso (1979-…) - Tomou posse do cargo em 4 de Novembro de 1979, em substituição do Padre António Dinis. Anteriormente paroquiava a freguesia da Benfeita.
Nota – Uma parte deste texto tem por base a pesquisa pormenorizada feita por Mário Paredes Ramos, que pode ser consultada em Arquivo Histórico de Góis.